Cristovão Fernandes Duarte
Pós-Doutor pela Cátedra UNESCO Diálogo Intercultural em Patrimónios de Influência Portuguesa da Universidade de Coimbra. Doutor em Planejamento Urbano e Regional IPPUR-UFRJ. Mestre em Urbanismo pelo PROURB/FAU-UFRJ. Graduação em Arquitetura e Urbanismo pela FAU-UFRJ. Professor Associado do PROURB/ FAU-UFRJ
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho pretende analisar os impactos produzidos sobre a paisagem urbana da Região Portuária do Rio de Janeiro a partir da implementação da Operação Urbana Consorciada, conhecida como “Porto Maravilha”, aprovada pela Lei Complementar nº 101 de 23 de novembro de 2009. Estendendo-se por cerca de 5 milhões de metros quadrados e abrangendo a totalidade dos bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo, que compõem a Região Portuária, o Porto Maravilha foi apresentado aos cariocas como a maior Operação Urbana Consorciada do Brasil. Sua implementação ficou a cargo do consórcio “Porto Novo” formado pelas empresas Odebrecht, OAS e Carioca Engenharia, sob a coordenadoria da Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro (CDURP).
A cidade vivia um período de grande excepcionalidade, tendo sido recém-eleita para sediar os Jogos Olímpicos de 2016[1], em meio aos preparativos para a realização da Copa do Mundo de Futebol de 2014. O montante dos recursos disponível para investimentos na cidade não encontrava precedentes históricos, sobretudo se levarmos em conta o curto espaço de tempo em que deveriam ser implementados. Se tomarmos em conta apenas os valores oficialmente declarados, relativos ao custo das Olimpíadas de 2016, chega-se à casa dos 40 bilhões de reais. Tais investimentos representavam, no ano de 2010, duas vezes e meia o total anual da arrecadação da cidade ou, ainda, 25% do PIB Carioca[2].
Além da construção de instalações esportivas para os jogos, o elenco de obras prioritárias compreendia: a construção, implantação e operação de quatro linhas de BRT – Transoeste, Transcarioca, Transolímpica e Transbrasil, a duplicação do Elevado do Joá, o Porto Olímpico, o Parque Olímpico, a construção do Museu do Amanhã e Museu de Arte do Rio (MAR), entre outras. Vale destacar entre as obras posteriormente adicionadas ao “pacote olímpico”, a construção de um campo de golfe na Área de Proteção Ambiental de Marapendi (APA Marapendi), às margens da Lagoa de mesmo nome.
A estratégia adotada pela Prefeitura da Cidade para justificar o caráter prioritário da Operação Urbana Consorciada do Porto Maravilha e, assim, legitimá-la junto à opinião pública, foi associá-la ao conjunto de obras previstas para a realização dos Jogos Olímpicos. O vínculo inicialmente estabelecido entre as Olimpíadas e as obras de reabilitação urbana da Região Portuária consistiu na alegação por parte da Prefeitura de que a Vila de Mídia e dos Árbitros seria construída como parte das intervenções do Porto Maravilha, no bairro de Santo Cristo. Tal fato, como se verificou posteriormente, não se concretizou como o prometido, tendo a Vila dos Árbitros sido construída na zona oeste da cidade, mais próximo, portanto, do Parque Olímpico, onde se realizariam grande parte dos jogos.
Para a abordagem aqui pretendida, o trabalho foi estruturado em três grandes blocos. O primeiro consiste numa breve notícia histórica da formação da área em estudo, balizando, através de plantas históricas e do acervo edificado, o processo de consolidação urbana do patrimônio cultural e industrial da Região Portuária do Rio de Janeiro. O segundo bloco pretende apresentar, ainda que de forma sucinta, o elenco de propostas desenvolvidas pela OUC Porto Maravilha. Na sequência veremos como se deu a implementação daquelas propostas, bem como os impactos produzidos. O terceiro e último bloco, apresenta imagens do Google Street View, contrastando imagens anteriores e posteriores às intervenções implementadas, visando documentar o processo de “cancelamento” da paisagem que dá título ao presente trabalho.
As expressões “cancelamento da paisagem” e “assédio urbanístico” são aqui utilizadas para enfatizar a forma pela qual determinados projetos de intervenção urbana, como a OUC do Porto Maravilha, promovem a destruição do patrimônio cultural e o apagamento da memória coletiva, ao desconsiderar e desvalorizar a cidade preexistente. Tratam-se, em geral, de projetos voltados para o atendimento de interesses particulares de grupos privados, assumindo, inevitavelmente, um caráter autoritário, avesso ao debate democrático e sem a participação de especialistas, moradores e outros atores sociais. Dessa forma, esses projetos afirmam-se como, supostamente, capazes de resolver todos os problemas da cidade, preconizando, para tanto, a substituição da cidade existente por uma cidade idealizada, construída ex nihilo, onde tudo, funcionaria perfeitamente. Contudo, as soluções impostas de cima para baixo, acabam por criar novos problemas, além de agravar aqueles já existentes. Tal processo gera graves e continuados danos econômicos, sociais e culturais para as cidades, justificando-se, dessa forma as metáforas do assédio urbanístico e do cancelamento da paisagem.
2 FORMAÇÃO HISTÓRICA DA ZONA PORTUÁRIA
Após a fundação da cidade em 1565, seus primeiros habitantes passaram a ocupar as encostas do Morro do Castelo. Nos anos que se seguiram a cidade se espraia, descendo para a planície. Assim, a partir do século XVII, o núcleo urbano pioneiro da cidade passa a ocupar uma área confinada a sul pelos morros do Castelo e Santo Antônio e a norte, pelos morros de São Bento e Conceição, desenvolvendo-se, progressivamente, das margens da Baía de Guanabara até o Mangal de São Diogo, que representou até o início do século XIX um obstáculo à expansão da cidade na direção oeste.
Entre o Morro de São Bento e o Morro do Castelo é aberta a Rua Direita (atual Primeiro de Março), a principal via da cidade até finais do século XIX. A meio da Rua Direita, numa área aterrada às margens da Baía, surge o Largo do Carmo (atual Pça. XV de Novembro). O nome original decorreu de sua localização em frente à Igreja e ao Convento de Nossa Senhora do Carmo. Aí se construiu o principal cais da cidade, onde chegavam mercadorias, visitantes ilustres e pessoas escravizadas.
A localização estratégica dessa grande praça aberta para o mar e principal ponto de embarque e desembarque, faria dela o centro de decisão política da cidade. Nela se construiria a Casa da Moeda e o Real Armazém, transformado depois no Palácio dos Governadores (1743), depois em Palácio dos Vice-Reis (1763) e, quando da chegada da Corte portuguesa em 1808, no Paço Real.
A transformação do Rio de Janeiro em capital da Colônia a partir de 1763, revela e confirma o protagonismo da cidade como entreposto do comércio de pessoas escravizadas e escoadouro do ouro de Minas Gerais para a Metrópole.
Figura 1 – Panorama da cidade do Rio de Janeiro, Emil Bauch, 1873
Fonte: Fundação Biblioteca Nacional – BNDigital. Disponível em: <http://objdigital.bn.br/objdigital2/acervo_digital/div_iconografia/icon255675/icon255675.jpg>
Em meados da década de 1770, com a construção do Cais do Valongo, o embarque e desembarque de pessoas escravizadas e mercadorias, seria transferido para a estreita faixa litorânea entre a Baía e o enfileiramento dos morros situados a norte do núcleo pioneiro da cidade, onde no correr do século XVII, já haviam surgido as primeiras ruas e edificações dos futuros bairros da Saúde e Gamboa.
O marco histórico mais antigo e ainda presente na paisagem da zona portuária é a Igreja de São Francisco da Prainha, construída em 1696 no bairro da Saúde, sobre um promontório nas encostas do Morro da Conceição. A fachada atual data, fundamentalmente, da reconstrução da Igreja, ocorrida em 1740.
Figura 2 – Igreja de São Francisco da Prainha
Fonte: Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro. Disponível em: <http://www.rio.rj.gov.br/web/portaldoservidor>. Acesso em: 14 fev.2022
Geograficamente isolados do resto da cidade pelo paredão formado, sobretudo, pelos Morros da Conceição e Livramento, os bairros da Saúde e Gamboa se consolidam como zona portuária da cidade (SEGRE e ORTIZ, 2010, p. 120). Convenientemente abrigadas das vistas da elite da cidade, puderam aí se desenvolver atividades consideradas menos nobres, como o trabalho braçal dos estivadores do cais do porto, a presença dos tripulantes das embarcações, a prostituição e, sobretudo, a chegada de pessoas escravizadas trazidos pelos navios negreiros. O sepultamento dos que adoeciam e morriam passou a ser feito no cemitério dos Pretos Novos, instalado na zona portuária, numa área afastada e pouco habitada junto ao Saco da Gamboa[3].
De acordo com Honorato, não existia uma construção que centralizasse de forma exclusiva o mercado de pessoas escravizadas. A compra e venda dos recém-chegados era desenvolvida em uma série de lojas comerciais situadas nos dois lados de algumas ruas próximas ao Cais do Valongo. Os escravizados ficavam em exposição no térreo (que podia se estender até o quintal), deixando-se o pavimento superior reservado para a habitação do proprietário e sua família (2008, p. 74).
A transferência do mercado de pessoas escravizadas para a região do Valongo contribuiu de forma significativa para a consolidação das atividades comerciais e portuárias da região (ibid., p. 142). Como consequência imediata dos condicionantes acima descritos, a zona portuária se tornaria uma região destinada à moradia da classe trabalhadora e com uma população formada majoritariamente por afrodescendentes. À população local juntaram-se negros libertos que chegavam do recôncavo baiano a procura de trabalho e moradia. “Pequena África” foi como o sambista e compositor Heitor dos Prazeres denominou os arredores da Pedra do Sal no bairro da Saúde. Marco simbólico e reduto de resistência da cultura afro-brasileira no Rio de Janeiro, aí a comunidade se reunia em festas populares, rodas de samba e de capoeira.
As grandes transformações sofridas pela cidade com a chegada da família real no início do século XIX refletiram-se também sobre a zona portuária. Entre as primeiras decisões reais destaca-se a Abertura dos Portos às Nações Amigas decretada em 1808, ano da chegada de D. João. Tal medida produziu um incremento às atividades portuárias e, consequentemente, a ampliação do processo de urbanização e desenvolvimento da Saúde, da Gamboa, do Saco do Alferes (local onde posteriormente surgiria o bairro de Santo Cristo) e da praia Formosa (atual Av. Francisco Bicalho).
Com a proibição do tráfico negreiro em 1831, o Cais do Valongo continuou funcionando normalmente voltado para o embarque e desembarque de passageiros e mercadorias. Embora proibido, o tráfico escravista manteve-se como atividade clandestina em declínio até sua extinção em meados do século XIX.
No ano de 1843, face ao progressivo assoreamento da orla, o Cais do Valongo foi aterrado, sendo construído um novo cais. Denominado Cais da Imperatriz, foi construído para receber a princesa napolitana Teresa Cristina Maria de Bourbon, que viria a se tornar a Imperatriz do Brasil (IPHAN, 2016, p. 34).
Mais tarde, em 1871, é construído à beira mar as Docas de D. Pedro II, um armazém de grande porte, projetado e construído pelo engenheiro André Rebouças. Negro e abolicionista, Rebouças fez constar no contrato da construção do edifício uma cláusula proibindo a utilização de negros cativos. Um incêndio destruiu grande parte do edifício em 1919. Reconstruído em 1920, o edifício encontra-se tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em razão de seus significados históricos, como símbolo da luta pelo fim da escravidão. Em 2003 o Armazém Docas de D. Pedro II foi cedido pelo governo federal para abrigar as atividades da ONG Ação pela Cidadania. Desde então, o prédio passou a ser conhecido como Galpão da Cidadania.
Ainda no final do século XIX é fundado o Moinho Fluminense, a primeira fábrica de moagem de trigo do Brasil. Sua importância para a atividade econômica do porto pode ser avaliada pelo fato de que seu alvará foi concedido pela Princesa Isabel (CHIAVARI, 2021). A inauguração do prédio ocorre em 1887 com a construção de um edifício monumental para época, como um exemplar da arquitetura fabril inglesa. O edifício principal e o silo ocupam a quadra lindeira à Praça da Harmonia, estendendo-se da rua Sacadura Cabral (antiga rua da Prainha) até às margens da baía. Com os sucessivos aterros da zona portuária no início do século XX, o complexo industrial do Moinho Fluminense foi sendo acrescido de novas edificações, interligadas por passadiços sobre as novas ruas até a Av. Rodrigues Alves, junto aos novos armazéns do cais do Porto.
Com a Proclamação da República (1889), a cidade, agora elevada à condição de Distrito Federal, viveria um período de grandes transformações. No início do século XX, concomitantemente com a Reforma da área central levada a cabo pela administração do Intendente Pereira Passos (1902-1906), a Zona Portuária foi radicalmente transformada por vultuosos investimentos do governo federal. Uma grande faixa de aterro preencheu o espaço entre a antiga orla sinuosa e o cais retificado do novo porto da cidade. Sobre a área de aterro foi implantada uma nova malha viária de amplas ruas e avenidas retilíneas, circunscrevendo quadras estreitas e compridas preponderantemente subordinadas às atividades portuárias e à circulação de veículos de carga e descarga. Nestas quadras construíram-se galpões industriais e armazéns destinados ao processamento e estocagem de mercadorias. O gigantismo assumido pelo novo traçado viário mantém-se ainda hoje perfeitamente legível na planta cadastral urbana, contrastando fortemente com o tecido urbano preexistente.
Figura 3 –Planta Geral da Cidade do Rio de Janeiro, 1923 (DET)
Fonte: Fundação Biblioteca Nacional – BNDigital. Disponível em: <http://objdigital.bn.br/objdigital2/acervo_digital/div_cartografia/cart522721/cart522721.jpg>
A segunda metade do novecentos é inaugurada com as obras do Elevado da Perimetral, construído em várias etapas entre o final dos anos 50 e início dos 70. Trata-se de uma ligação expressa entre a Avenida Brasil, a Ponte Rio Niterói, o Aeroporto Santos Dumont e as pistas do Parque do Flamengo. Excetuando-se as alças de subida e descida no bairro da Saúde, próximo à Av. Barão de Tefé, o elevado não estabelecia nenhuma outra ligação com os bairros portuários da Gamboa e Santo Cristo. Junto ao largo da igrejinha de Santo Cristo, deságua também o fluxo motorizado carreado da zona sul da cidade pelo viaduto São Sebastião, ligado ao túnel Santa Bárbara, construído na década de 60.
A decadência das atividades portuárias e a obsolescência das infraestruturas existentes começam a se fazer notar a partir dos anos 70, sobretudo, em razão dos efeitos produzidos pela “conteinerização” do transporte internacional de mercadorias. Calados mais profundos para receber navios cada vez maiores, bem como a construção de áreas retro portuárias para empilhamento e transporte de contêineres foram exigências que alteraram de forma radical a operação das atividades portuárias, bem como a relação tradicionalmente estabelecida entre porto e cidade (VASCONCELLOS e SILVA, 2009). Ressalte-se ainda a crescente subutilização dos armazéns e galpões existentes na Zona Portuária.
Sobre a fase de estagnação e obsolescência vivida pela Zona Portuária, Carlos (2010) afirma que:
A falta de investimentos públicos em infraestrutura urbana, combinada com uma legislação de uso e ocupação do solo urbano permissiva aos usos incompatíveis com o residencial, foram fatores decisivos para a deliberada degradação da qualidade de vida nos bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo (p. 39).
A criação em 1984 da Área de Proteção dos bairros da Saúde, Santo Cristo, Gamboa e Centro (regulamentada em 1988), representou uma vitória do movimento comunitário liderado pela associação de Moradores da Saúde (AMAS) que conseguiu barrar o projeto de “revitalização” elaborado pela Associação Comercial do Rio de Janeiro no início dos anos 1980. A “revitalização” proposta consistia na completa renovação urbana dos bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo, por intermédio da liberação dos gabaritos permitidos para novas edificações. Ainda segundo Carlos, “a iniciativa desconsiderava completamente o conjunto arquitetônico existente, bem como o contexto social e econômico da região” (Ibid.).
Se, nos anos 80, a zona portuária pode, através da mobilização popular, impedir aquela primeira tentativa de cancelamento da paisagem e apagamento da memória urbana, o mesmo não se passaria com o Projeto Porto Maravilha, na segunda década do ano 2000.
3 PORTO MARAVILHA, UM MEGAEMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO BASEADO NA VERTICALIZAÇÃO E NO RODOVIARISMO
A Lei Complementar nº 101 de 23 de novembro de 2009 não apenas autorizava o Poder Executivo a instituir a Operação Urbana Consorciada da Região do Porto do Rio, como também introduzia modificações no Plano Diretor da Cidade. A despeito da magnitude das implicações de uma lei destinada a modificar o Plano Diretor, que constitui a “carta magna” do município e principal instrumento da política urbana, a Lei Complementar 101 de 2009 não passou pelo crivo de um debate amplo, democrático e transparente. Redigida pelo Executivo Municipal, foi aprovada em regime de urgência por esmagadora maioria de vereadores na Câmara Municipal.
Como referido anteriormente, a Prefeitura apresentou a OUC do Porto Maravilha como parte do conjunto de obras necessária à preparação da cidade para a realização dos Jogos Olímpicos de 2016. Tal estratégia revelou-se extremamente eficaz, permitindo legitimar a “revitalização” da zona portuária como uma prioridade de investimentos públicos. De fato, apenas para a fase inicial da OUC, relativa às obras de infraestrutura do porto, foram destinados 8 bilhões de reais a serem pagos com recursos municipais.
Para Vainer (2011) o Rio de Janeiro estava submetido a um novo tipo de regime urbano, por ele denominado “cidade de exceção”, no qual torna-se regra a invisibilização dos processos decisórios, liberando-os dos entraves decorrentes dos controles políticos e burocráticos. Ainda segundo Vainer:
A cidade de exceção transforma o poder em instrumento para colocar a cidade, de maneira direta e sem mediações na esfera da política, a serviço do interesse privado de diferentes grupos de interesses (2011, p.11).
Mesmo sem pretender pormenorizar aqui o texto da lei, vale um breve comentário sobre as alterações relativas aos novos gabaritos aprovados para a zona portuária.
O Anexo IV delimita a Área de Especial Interesse Urbanístico, sobre a qual incidirá a OUC, em 14 setores que, no Anexo V, aparecem subdivididos em 30 Subsetores. Em seguida, o Anexo V-B, apresenta o QUADRO DE PARÂMETROS URBANÍSTICOS POR SUBSETOR, no qual são indicados o gabarito máximo permitido, taxa de ocupação, Coeficiente de Aproveitamento Básico (CAB) e Coeficiente de Aproveitamento Máximo (CAM) para cada subsetor.
Cabe ressaltar que os subsetores com gabaritos máximos de até 18 metros de altura correspondem ao que estabeleceu a Área de Proteção Ambiental (APA) em parte dos bairros da Saúde, Santo Cristo, Gamboa e Centro, instituída pelo Decreto nº 7.351/1988. Deste modo, de acordo com o Quadro do Anexo V-B, acima referido, dois subsetores permitem gabaritos máximos de 7,5 m e 9,0 metros de altura, que correspondem a uma edificação de até 2 pavimentos; na sequência existem 11 subsetores com gabaritos de 11 metros ou três pavimentos; dois subsetores com gabaritos de 15 metros ou quatro pavimentos; 1 subsetor com gabarito de 18 metros ou cinco pavimentos; a partir daí verifica-se um significativo aumento dos gabaritos máximos permitidos, chegando a 60 metros de altura ou 20 pavimentos em parte de Santo Cristo (subsetores B5, C4 e D3); 90 metros de altura ou 30 pavimentos nas áreas da Saúde, Gamboa e lado par da Av. Presidente Vargas (subsetores A3, B4 e E1); 120 metros de altura ou 40 pavimentos junto à Av. Rodrigues Alves em Santo Cristo e numa área localizada no terreno da Companhia Estadual de Gás – CEG (subsetores C2, D2, E2 e M3); e, finalmente, 150 metros de altura ou 50 pavimentos ao longo da Av. Francisco Bicalho (subsetores C3, D1, M1, M2).
A inédita elevação de gabaritos para os padrões usuais da cidade, tinha por objetivo alavancar a venda dos certificados de potencial adicional de construção (CEPACs), emitidos pelo município. De acordo com Werneck (2017), trata-se de um novo tipo de especulação imobiliária, “financeirizada”.
Como se depreende do Anexo V da referida lei que apresenta a delimitação dos subsetores, os gabaritos mais elevados localizam-se numa faixa praticamente contínua, junto à Av. Rodrigues Alves, que se estende da Praça Mauá até a Av. Francisco Bicalho, atravessando todos os bairros da zona portuária.
Figura 4 – Mapa de Subsetores com os gabaritos máximos permitidos
Fonte: CDURP
A venda das CEPACs como se verificaria mais tarde, estagnou em torno de 10%, não possibilitando de imediato a plena concretização do sonho da “Dubai Carioca”, como passou a ser popularmente chamado o Porto Maravilha. Não obstante o fiasco do modelo de negócios adotado, o impacto provocado pelas torres que chegaram a ser, efetivamente, construídas nos permite atestar o equívoco do projeto, bem como sua incompatibilidade com a paisagem cultural existente na região.
A estratégia de marketing urbano utilizada para atrair os investimentos necessários para o sucesso daquele megaempreendimento imobiliário (travestido de um projeto de “revitalização urbana”) consistiu na criação de um evento extraordinário que atraísse as atenções e o interesse do mercado. A demolição do elevado da Perimetral foi o mote encontrado para alavancar uma massiva propaganda através da grande Mídia e da internet sobre a OUC do Porto Maravilha. Tratava-se de uma intervenção de grande envergadura, destinada a sinalizar a irreversibilidade do processo de remodelação da área, assegurando credibilidade e a segurança necessárias para a adesão do mercado, o que, por sua vez, confirmaria a expectativa de valorização imobiliária dos seus promotores.
A ideia de demolir um viaduto de concreto e aço destinada ao tráfego automotivo, símbolo anacrônico do rodoviarismo e fonte de poluição sonora e atmosférica, conquistou não apenas o mercado, mas também a opinião pública de uma maneira geral. Construiu-se a narrativa de que a perimetral era o grande empecilho à modernização e ao desenvolvimento da zona portuária, representando uma barreira entre a cidade e a Baía de Guanabara. Desta forma, sua demolição passou a ser vista como condição indispensável para o processo de “revitalização urbana” pretendido.
Figura 5 – Implosão Elevado da Perimetral
Fonte: Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro. Disponível em: <http://www.rio.rj.gov.br/web/guest/exibeconteudo?id=4474034>
A implosão, em etapas, transformou-se num grande espetáculo midiático, filmado e televisionado por vários ângulos diferentes. Ao todo foram demolidos cerca de 5 quilômetros de viaduto, constituído por toneladas de concreto e mais de mil vigas de aço, transformados em poucos segundos em material de demolição, ao custo estimado de 1,5 bilhões de reais[4]. Tratava-se, sem dúvida, de uma bem-sucedida estratégia de marketing urbano.
Poucas vozes se levantaram, na época, em defesa de propostas alternativas à demolição da estrutura do elevado. Destaque-se, entre essas, um estudo preliminar desenvolvido em 2010 por professores e alunos da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ, propondo a utilização do elevado para a implantação de um sistema sobre trilhos, mais econômico e sustentável, que aproveitava o trajeto do próprio elevado para interligar o Aeroporto Tom Jobim na Ilha do Governador ao Aeroporto Santos Dumont, no centro do Rio de Janeiro[5]. A proposta foi apresentada à Companhia de Desenvolvimento da Região do Porto – CDURP, que não demonstrou interesse em alterar os planos iniciais da OUC do Porto Maravilha, sendo o primeiro trecho da Perimetral implodido em novembro de 2013.
No lugar do Elevado da Perimetral foi implantada uma via expressa com 6 faixas de rolamento que, conectada a um túnel subterrâneo de cerca de 3,4 km de extensão, interliga a Rodoviária Novo Rio às pistas do Parque do Flamengo, junto ao Aeroporto Santos Dumont. O Túnel Prefeito Marcello Alencar, como foi denominado, constitui uma obra de engenharia monumental, tendo sua construção iniciada antes mesmo da conclusão da demolição do viaduto. O túnel possui duas galerias subterrâneas com três pistas cada uma: a galeria que segue no sentido da rodoviária tem capacidade para 110 mil veículos/dia, enquanto que a galeria no sentido Parque do Flamengo, tem capacidade para receber até 55 mil veículos/dia. Considerado o maior túnel subterrâneo no país, foi construído às margens da Baia de Guanabara, na área de aterro que ampliou as instalações portuárias no início do século XX. O túnel atinge no ponto de maior profundidade a cota de 40 metros abaixo do nível do mar, tendo sido dotado de um sistema de drenagem composto por cisterna com capacidade útil para armazenar 390 mil litros de água e quatro bombas, cada uma com capacidade de retirar 100 metros cúbicos de água por hora, com elevados custos de operação e manutenção[6].
Figura 6 – Via Expressa e Via Binário do Porto
Fonte: desenho do autor sobre imagem Google Earth
Paralelamente à Via Expressa e estendendo-se por 3,5 km, foi implantada a Via Binário do Porto. Como o nome indica, trata-se de uma via dupla, possuindo três faixas no sentido Centro e outras três em direção à Avenida Brasil e Ponte Rio-Niterói, destinadas ao tráfego que cruza a zona portuária. Além de complementar o escoamento do fluxo motorizado realizado pela Via Expressa, a Via Binário permite a distribuição interna do trânsito na Zona Portuária do Rio de Janeiro já que, ao contrário da Via Expressa, ela se encontra conectada com a malha viária existente. Por esta razão, foi também possível utilizar alguns trechos da via para implantar a linha 1 do VLT Carioca que liga a Rodoviária Novo Rio ao Aeroporto Santos Dumont.
Para acessar a Via Binário a partir do Centro foi necessária a construção de um segundo túnel subterrâneo, denominado Túnel Rio 450 anos. Estendendo-se por 1.480 m, o túnel atravessa o subsolo do bairro da Saúde, desde a Rua Visconde de Inhaúma até a Rua Antônio Lage, junto ao conjunto arquitetônico do Moinho Fluminense.
Ao atravessar o bairro da Gamboa as duas pistas da Via Binário cruzam um terceiro túnel, o Túnel Arquiteta Nina Rabha, escavado sob o Morro da Saúde. Com 80 metros de extensão, o túnel possui duas galerias destinadas ao tráfego de automóveis. Uma das galerias tem como sentido o bairro da Saúde, enquanto que a outra tem como sentido o bairro do Santo Cristo. O túnel possui ainda uma terceira galeria central, destinada exclusivamente à circulação do VLT.
Figura 7 – Via Binário e Túnel Arquiteta Nina Rabha
Fonte – Google Street View
As obras acima apresentadas constituem, por assim dizer, o conjunto de intervenções principais que estruturaram a OUC do Porto Maravilha. Eles ocorreram sob o pano de fundo de um conjunto de outras intervenções menos destacadas quais sejam a reurbanização de vias existentes, pavimentação, drenagem, sinalização viária, iluminação pública e paisagismo.
A mera apresentação das principais intervenções propostas pela OUC permite constatar um constrangedor descompasso entre o discurso preservacionista usado na propaganda do Porto Maravilha e os reais objetivos perseguidos por seus promotores. Em nome do combate à “cidade do automóvel”, simbolizada pelo Elevado da Perimetral, foi implementado um programa ultra rodoviarista com a implantação de uma Via Expressa que atravessa indiferente uma área histórica importante da cidade, a construção da Via Binário com duas novas pistas para automóveis, além de dois túneis subterrâneos de grande porte e um túnel escavado no Morro da Saúde, que abriga em seu cume a igreja setecentista dedicada a Nossa Senhora da Saúde.
A ampliação do sistema viário da cidade preexistente implicou no alargamento e redesenho de várias ruas da malha urbana existente para absorver o volume de tráfego gerado pela demolição da Perimetral, acarretando a eliminação parcial do traçado urbano original e o desaparecimento de galpões industriais, armazéns portuários e outras edificações que compõem, como registros documentais que são, a memória urbana da zona portuária.
O desventramento do tecido urbano promovido pela OUC do Porto Maravilha cumpriu a função de possibilitar/permitir o surgimento de torres envidraçadas de até 50 andares, formando enclaves corporativos, apartados da cidade envolvente. No entanto, o gigantismo dos empreendimentos não obteve a resposta esperada por parte do mercado. De acordo com pesquisa realizada pela consultoria especializada Cushman & Wakefield, citada pelo jornal OGLOBO de 06/02/2018:
a região portuária registrou taxa de vacância de 83,5% no último trimestre de 2017, mais que o dobro da taxa da cidade do Rio como um todo, que foi de 40,7%. Com muitos escritórios vagos, os preços no Porto estão caindo. De acordo com a consultoria, o preço médio na região caiu 11% em um ano, para R$ 87,7 o metro quadrado[7].
Vale, por fim, destacar que o Condomínio Residencial Porto Vida, único empreendimento habitacional lançado durante as obras da OUC do Porto Maravilha e cuja construção foi iniciada em 2017, permanece até a presente data como um esqueleto de concreto armado, com as obras paralisadas.
4 CANCELAMENTO DA PAISAGEM E ASSÉDIO URBANÍSTICO
Visando ilustrar, segundo a abordagem conceitual aqui proposta, o processo de cancelamento da paisagem urbana e assédio urbanístico na zona portuária do Rio de Janeiro, utilizaremos imagens retiradas do Google Street View, anteriores e posteriores às intervenções implementadas pela OUC do Porto Maravilha, além de outras imagens publicadas na internet.
O primeiro conjunto de imagens mostra a av. Rodrigues Alves antes e depois da derrubada do Elevado da Perimetral. A figura 8-a corresponde a uma foto do Google Street View de novembro de 2011, mostrando o Armazém 10, na Avenida Rodrigues Alves, ainda sob o viaduto. Este armazém integra o conjunto de 18 armazéns portuários que compõem o Cais da Gamboa, inaugurado em 1910, após a conclusão das obras de expansão da zona portuária. Embora construídos na mesma época com a mesma configuração arquitetônica, apenas os armazéns 01, 02, 03, 04, 05, 06 e 07 encontram-se tombados pela municipalidade.
Em acurado estudo sobre a tipologia arquitetônica dos armazéns do Cais da Gamboa, no Porto do Rio, Lima e Mesentier (2020, p. 5) demonstram a importância estratégica da preservação do patrimônio industrial portuário, através do reuso de suas instalações.
Figuras 8-a e 8-b
Fonte – Google Street View
Destaca-se na fachada dos armazéns o beiral suportado por mãos francesas em ferro trabalhado, que além de proteger a área de carga e descarga onde estacionavam os caminhões, constituíam também elementos compositivos de ornamentação da fachada.
Com a implantação da via expressa junto à fachada dos armazéns, como mostra a figura 8-b do Google Street View em maio de 2017, além desses elementos terem sido suprimidos, o próprio acesso aos armazéns pelo lada da cidade foi eliminado. Os portões originais dos armazéns que se abriam para a Av. Rodrigues Alves, encontram-se inacessíveis. Uma mureta de concreto construída entre a via expressa e os armazéns, se encarrega impedir qualquer possibilidade de acesso. O espaço de cerca de 50 cm entre a mureta e a fachada dos armazéns foi aterrado com entulho de obra e pó de pedra, emparedando permanentemente os portões originais.
À direita na imagem aparece uma das duas torres de 22 pavimentos de escritórios do empreendimento Aqwa Corporate, projetada pelo escritório Norman Foster + Partners.
O segundo conjunto de imagens apresenta uma visada a partir de uma rua perpendicular à av. Rodrigues Alves. Neste caso, utilizou-se como exemplo a Rua de Santo Cristo, numa foto do Google Street View tomada em janeiro de 2010, que mostra o Elevado da Perimetral e ao fundo um dos armazéns do Cais do Porto. A imagem evidencia que, apesar do gigantismo da estrutura de concreto e aço do viaduto e, não obstante, a poluição gerada pelo tráfego de veículos, sua altura permite que se veja o armazém e que se possa mesmo acessá-lo, cruzando por debaixo do Elevado. Quando se observa a cena a partir do mesmo ponto, através da figura 9-b, tomada pelo Google Street View em junho de 2017, já não há o viaduto, mas no seu lugar surge a Via Expressa interditando completamente o acesso aos armazéns. Cai por terra, portanto, a estratégia discursiva que afirmava ser a demolição do Elevado da Perimetral a supressão de uma barreira entre a cidade e a Baía de Guanabara. Ressalte-se ainda que a própria via de onde foram tomadas as fotos se transformou num cul-de-sac, já que não seria possível sua conecção à Via Expressa.
Figuras 9-a e 9-b
Fonte – Google Street View
A figura 10 demonstra claramente como a Via Expressa representa uma barreira física intransponível entre a cidade e a Baía de Guanabara. Além das seis faixas de rolamento da via, construídas junto aos armazéns do Cais do Porto, uma via de serviço foi implantada entre a via expressa e o tecido urbano dos bairros da zona portuária. A figura não deixa margem para dúvidas com relação ao caráter rodoviarista da OUC do Porto Maravilha.
Figura 10
Fonte: Agência O Globo / foto Márcia Foletto. Disponível em: <https://oglobo.globo.com/rio/novo-trecho-da-avenida-rodrigues-alves-sera-inaugurado-em-abril-19054337>
Junto ao Armazém 8, a partir da “submersão” da via expressa no túnel subterrâneo, inicia-se o Boulevard Olímpico ou Orla Luiz Paulo Conde, estendendo-se pelo trajeto que antes ficava sob a perimetral, até o Largo da Misericórdia, junto ao Museu Histórico Nacional. Durante as Olimpíadas, no primeiro trecho que vai até a Praça Mauá, onde estão localizados o Museu de Arte do Rio e o Museu do Amanhã, o boulevard foi palco de festas e shows de música com livre acesso ao público, atraindo multidões de espectadores. A figura 11 documenta o tratamento paisagístico recebido pelo Boulevard Olímpico, com vegetação, iluminação e mobiliário urbano, tendo de um lado os Armazéns do Cais do Porto, tombados pelo município e do lado da cidade as fachadas das edificações originalmente voltadas para a Av. Rodrigues Alves. Os armazéns, embora restaurados, não estão abertos ao público, sendo utilizados para eventos privados. As edificações lindeiras ao Boulevard, receberam um tratamento de fachada que consistiu em painéis pintados por artistas convidados. Destaca-se o Painel “Etnias” do artista Kobra, considerado pelo Guiness como o maior mural de grafite do mundo. O reconhecimento da beleza dos murais não elude o fato de que se tratam de um expediente utilizado de forma generalizada para uma pseudo-reabilitação urbana, já que, em sua maioria, os edifícios assim “maquiados” permanecem internamente em avançado estado de degradação.
Figura 11: Boulevard Olímpico
Fonte: Dronestagr. Disponível em <http://www.dronestagr.am/boulevard-olimpico-rio-de-janeiro-brazil/> Acesso em: 03 fev. 2022
As imagens 12-a e 12-b, tomadas pelo Street View, respectivamente, em dezembro de 2016 e novembro de 2021, documentam o desaparecimento de um conjunto de sobrados localizados na Av. Venezuela, próximo ao Moinho Fluminense. Além do evidente valor histórico e arquitetônico, os sobrados abrigavam há mais de três décadas, o Armazém Cultural das Artes, onde artistas, cenógrafos, carpinteiros, entre outros profissionais, produziram os cenários para mais de três mil produções teatrais. Em paralelo, eram oferecidas oficinas de formação técnica especializada, cumprindo a importante missão de transmitir a tradição do ofício para as novas gerações.
O imóvel, pertencente à Cia. Docas do Rio de Janeiro, estava abandonado quando aí se instalou o Armazém Cultural das Artes. Com o início dos trabalhos da OUC Porto Maravilha, o prédio foi cedido à Companhia de Desenvolvimento Urbano (Cdurp) que solicitou a desocupação do imóvel. Na época, segundo informação da própria Cdurp, o terreno já estaria destinado à construção de um complexo residencial com 1.440 unidades. Por três anos, a classe artística tentou, em vão, resistir ao assédio e impedir o cancelamento da história do Armazém Cultural das Artes. Durante as negociações foi apresentado, inclusive, um projeto para a transformação da área na “Cidade do Teatro” num polo cultural idealizado pelo diretor e ator Amir Haddad, destinado a abrigar e desenvolver diversas atividades relacionadas com a produção teatral[8].
Figuras 12-a e 12-b
Fonte – Google Street View
A figura 12-b mostra a demolição integral do conjunto, que se estendeu entre meados de 2017 e início de 2020 e que permanece ainda hoje como um terreno baldio. Aquilo que poderia (e deveria) ter sido tomado como um exemplo bem-sucedido de reabilitação do patrimônio cultural urbano, a ser valorizado e estendido por toda a zona portuária, foi implacavelmente cancelado pela lógica da especulação imobiliária, financeirizada pela negociação das CEPACs, que presidiu a concepção da OUC do Porto Maravilha.
Os exemplos dos equívocos cometidos se sucedem por toda a área, não sendo possível aqui documentá-los de forma exaustiva. Passemos ao processo de hiper-verticalização apenas iniciado no Porto do Rio.
Figuras 13-a e 13-b
Fonte – Google Street View
A figura 13-a, tomada em agosto de 2014 mostra a Av. Barão de Tefé no bairro da Saúde, tendo à direita a fachada do Galpão da Cidadania, antigo Armazém das Docas de D, Pedro II, e à esquerda a Praça Jornal do Comércio, onde, durante as obras de infraestrutura da OUC do Porto Maravilha, foram encontrados os vestígios arqueológicos do antigo Cais do Valongo. O Galpão da Cidadania pode ser considerado outro bom exemplo de reabilitação do patrimônio industrial presente na zona portuária. Cedido em 2003 pelo governo Federal para abrigar a ONG Ação pela Cidadania, o edifico recebeu um projeto do arquiteto Helio Pellegrino, conservando suas características arquitetônicas, ao mesmo tempo em que possibilitava o aproveitamento dos espaços internos para as atividades da ONG.
A figura 13-b, tomada em junho de 2021, mostra, à esquerda, as escadarias de acesso ao Sitio Arqueológico do Cais do Valongo e, ao fundo, o surgimento de duas torres corporativas, totalmente envidraçadas, ambas com 22 pavimentos e 90 metros de altura.
A torre da direita é o edifício sede da empresa multinacional de cosméticos L’Oreal, inaugurado em 2017. A torre da esquerda é o edifício de escritórios Vista Guanabara, um dos mais modernos e arrojados edifícios do Porto Maravilha. Inaugurado em junho de 2016, seus primeiros inquilinos foram a financeira italiana Assicurazioni Generali e a Casa Granado. A partir de então, amargou uma elevada taxa de vacância até finais de 2018 quando, em razão da queda generalizada nos preços, foram alugadas duas lajes corporativas para a instituição financeira sino-brasileira Bocom/BBM e seis para a AMIL.
Figura 14
Fonte: Agência O Globo / foto Márcia Foletto. Disponível em: <https://blogs.oglobo.globo.com/lauro-jardim/post/sao-paulo-do-financeiro-rio-do-petroleo-e-gas.html> Acesso em: 12 jan. 2022
A figura 14 mostra outra visada das torres corporativas da L’Oreal e Vista Guanabara, com os armazéns do Cais do Porto em primeiro plano. Dispensando maiores comentários, a fotografia registra de forma eloquente os impactos negativos produzidos pela OUC do Porto Maravilha na paisagem urbana da zona portuária.
As imagens que se seguem correspondem a dois complexos corporativos que enfrentaram dificuldades em função da baixa ocupação que se abateu sobre a região portuária. A figura 15 mostra as três torres do Porto Atlântico com 16 andares e 60 m de altura cada uma. Um dos prédios abriga o Novotel Porto Maravilha, os outros dois são blocos empresariais de escritórios para locação. Segundo o administrador do Porto Atlântico Marco Cardoso[9], em agosto de 2019, os blocos de escritórios registraram apenas 7% de ocupação. No início de 2020, antes da pandemia de COVID-19, uma pequena recuperação elevou essa taxa para 12%.
Figura 15 – Empreendimento Porto Atlântico
Fonte: Agência O Globo / foto Brenno Carvalho / Disponível em: <https://oglobo.globo.com/rio/zona-portuaria-uma-regiao-de-contrastes-24210821> Acesso em: 12 jan. 2022
A figura 16 mostra um ambicioso empreendimento desenvolvido pela Tishman Speyer no Porto Maravilha. Trata-se do Aqwa Corporate, projetado pelo renomado escritório Norman Foster+Partners, como já referido anteriormente. O complexo previa, originalmente, a construção de duas torres envidraçadas de 22 andares e 90 metros de altura. No entanto, somente uma das torres foi construída, sendo inaugurada em 2017 com muitos andares ainda desocupados. Para tentar atrair a atenção do mercado, o CASACOR 2017 foi instalado na cobertura, enquanto uma exposição sobre a “revitalização da zona portuária” ocupava o nono andar do edifício. Os sinais de recuperação só viriam a partir de 2021 com o anúncio da chegada da o Icatu Seguros e a Enel Brasil, além da diretoria da Caixa Econômica Federal, que alugou três andares do edifício.
Figura 16: Empreendimento Aqwa Corporate
Fonte: CDURP. Disponível em:< http://portomaravilha.com.br/portoatlantico> Acesso em: 03 fev. 2022
Por fim, as imagens seguintes contemplam o mais recente lançamento imobiliário na zona portuária do Rio de Janeiro, ocorrido em junho de 2021. Trata-se do primeiro empreendimento residencial da zona portuária, efetivamente construído, desde o início dos trabalhos da OUC do Porto Maravilha. Chamado de Rio Wonder Residences (numa alusão caricatural ao Porto Maravilha), o empreendimento marca o retorno de investimentos do mercado imobiliário na região portuária através da compra de Certificados de Potencial Adicional de Construção (Cepacs). A primeira fase do empreendimento comercializou 470 unidades habitacionais, denominadas de studios, de 1 e 2 quartos. Na sequência, serão oferecidas mais duas fases totalizando três torres de vinte andares e 1.224 apartamentos.
Figuras 17-a / 17-b – Empreendimento Rio Wonder Residences
Fonte: Cury Construtora. Disponível em: <https://cury.net/imovel/RJ/centro/cury-rio-wonder-residences-maua> Acesso em: 03 fev. 2022
Com uma arquitetura de qualidade duvidosa, implantado sem contato com o tecido urbano envolvente, isolado em si mesmo, o empreendimento reproduz a lógica condominial privatista e antiurbana, como se um condomínio fechado de classe média da Barra da Tijuca tivesse sido, inapropriadamente, transladado para o bairro de Santo Cristo, numa completa indiferença aos padrões tipológicos historicamente presentes na zona portuária.
Figuras 18-a / 18-b: Lançamento Rio Wonder Residences
Fonte: CDURP. Disponível em: <http://portomaravilha.com.br/noticiasdetalhe/5180-prefeito-lanca-primeiro-residencial-do-porto-maravilha> Acesso em: 03 fev. 2022
Nas figuras 18-a e 18-b, o prefeito que esteve à frente da OUC do Porto Maravilha entre os anos de 2009 e 2016, retorna ao executivo municipal, reeleito em 2021, e comparece ao stand de vendas do Rio Wonder, celebrando de viva voz mais um grave equívoco urbanístico cometido contra a cidade.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A escolha da cidade do Rio de Janeiro, em 2009, como sede dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de 2016 inaugura um período de grandiosos investimentos de infraestrutura urbana para a modernização da cidade. De acordo com a Matriz de Responsabilidade Olímpica, divulgada pelo Ministério dos Esportes, em conjunto com o Governo do Estado e a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, o montante investido alcançou, como já referido, a casa dos 40 bilhões de reais. Diante da perspectiva de abocanhar tão volumosos recursos em tão curto espaço de tempo, um reduzidíssimo grupo formado pelas maiores empreiteiras do país passou a disputá-los com furiosa avidez. Organizadas em consórcios privados, as grandes empreiteiras se apressaram na partilha dos recursos previstos e na imposição à administração pública de um bilionário elenco de obras a serem implementadas. Tais empreendimentos possuíam, como era de se esperar, um caráter eminentemente arbitrário, atendendo, sobretudo, aos interesses da especulação imobiliária e financeira (que desde há muito, andam juntas e irmanadas).
Como reação à investida dos interesses do poder econômico, caberia à Prefeitura assumir a tarefa de definir, através dos canais de participação democrática da sociedade, as reais prioridades para os investimentos, exercendo o seu papel de mediação entre os vários interesses em jogo. Seria esta uma oportunidade excepcionalmente favorável para que, à luz das diretrizes de planejamento urbano apontadas pelo Plano Diretor, a cidade do Rio de Janeiro pudesse enfrentar os problemas historicamente acumulados e promover o desenvolvimento urbano, com vistas à construção de uma cidade socialmente mais justa e ambientalmente mais responsável.
Infelizmente, no caso da OUC Porto Maravilha, como visto ao longo deste trabalho, prevaleceu a lógica da “cidade de exceção” de que nos fala Vainer:
As formas institucionais de democracia representativa burguesa permanecem, formalmente, operantes. O governo eleito governa, o legislativo municipal legisla… Mas a forma como governam e legislam produz e reproduz situações e práticas de exceção, em que poderes são transferidos a grupos de interesse empresarial (2011, p.11).
A Operação Urbana Consorciada do Porto Maravilha significou, na prática, a “terceirização” da própria gestão do espaço urbano da zona portuária da cidade. Com base na lei que criou a OUC do Porto Maravilha, o “projeto”, supostamente destinado à “revitalização urbana” da zona portuária, foi apresentado pelo consórcio empresarial concessionário e imposto de cima para baixo, sem passar pelo crivo de um debate democrático e, portanto, sem qualquer possibilidade de contestação por parte dos moradores e trabalhadores da região.
Revirada por tratores, bulldozers e retroescavadeiras e, ainda, devastada por toneladas de explosivos utilizados para implosão do Elevado da Perimetral, a “nova” zona portuária que surge dos escombros, deliberadamente produzidos pelas obras do Porto Maravilha, é uma cidade fantasma, sem moradores e sem vitalidade urbana. Escavada por quilométricos túneis subterrâneos, a zona portuária foi rasgada por três grandes vias de alta velocidade, impiedosamente pavimentadas com asfalto, que descaracterizaram de forma irreversível a fisionomia urbana e o tecido urbano preexistente. Tais resultados permitem à cidade do Rio de Janeiro ostentar hoje o título, tão patético quanto nefasto, de ser, talvez, a última das grandes metrópoles do planeta e investir maciçamente num programa ultra rodoviarista em pleno século XXI.
Induzidas e estimuladas pelos novos parâmetros urbanísticos aprovados pela legislação da OUC do Porto Maravilha, altíssimas torres de vidro passam a povoar ruidosamente a paisagem urbana da zona portuária. Construídas isoladas e apartadas do tecido urbano, constituem verdadeiros enclaves condominiais corporativos ou residenciais, afirmando um modo de vida anti-urbano que privilegia a propriedade privada individual em detrimento da apropriação coletiva dos espaços públicos.
Tal é, como se pretendeu demonstrar neste trabalho, a lógica empresarial que presidiu a concepção do Projeto “Porto Maravilha” e que perpetrou um verdadeiro desastre urbanístico e ambiental, repetindo modelos já testados no passado e cujos resultados não se mostraram acertados ou minimamente sustentáveis.
Trata-se, sem meias palavras, de um caso de assédio urbanístico exercido pelo poder econômico sobre a cidade e seus moradores, caracterizado pela imposição autoritária de interesses privados sobre o bem comum. Suas consequências se traduzem em graves e continuados prejuízos econômicos, sociais e culturais, entre os quais destacamos o cancelamento da paisagem urbana e o apagamento da memória histórica da zona portuária do Rio de Janeiro, escrita coletivamente por gerações de moradores/trabalhadores e testemunhada pelo seu acervo arquitetônico e industrial.
Por fim, relembramos David Harvey, quando afirma: (…) o neoliberalismo transformou as regras do jogo político. A governança substituiu o governo; os direitos e as liberdades têm prioridade sobre a democracia; a lei e as parcerias público-privadas, feitas sem transparência, substituíram as instituições democráticas; a anarquia do mercado e do empreendedorismo competitivo substituíram as capacidades deliberativas baseadas em solidariedades sociais (…) A criação de novos espaços urbanos comuns [commons], de uma esfera pública de participação democrática, exige desfazer a enorme onda privatizante que tem servido de mantra ao neoliberalismo destrutivo dos últimos anos (…) O direito à cidade não é um presente. Ele tem de ser tomado pelo movimento político (2013, pp. 76-81).
6 AGRADECIMENTOS
Esta pesquisa contou com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ).
7 REFERÊNCIAS
CARLOS, Claudio Antonio S. Lima. Um Olhar Crítico sobre a Zona Portuária da Cidade do Rio de Janeiro In: Bitacora 17 (2) 2010: 23 – 54. Universidad Nacional de Colombia, Bogotá. Disponível em: https://revistas.unal.edu.co/index.php/bitacora/article/download/18892/19783/61540. Acesso em 02 jan.2022
CHIAVARI, Maria Pace. Genealogia de uma empresa: de Gianelli & Cia a S.A. Moinho Fluminense. In: Moinho Fluminense Memoria. Autonomy Investimentos. Rio de Janeiro: Automática Edições, 2021. Disponível em: https://moinho.cargo.site/Genealogia-de-uma-empresa-de-Gianelli-Cia-a-S-A-Moinho-Fluminense. Acesso em: 03 fev. 2022.
DUARTE, Cristovão Fernandes. Jogos Olímpicos Rio-2016: a democratização da gestão pública do espaço urbano como um legado (possível/impossível) a ser conquistado pela população da cidade. Biblio 3W – Revista Bibliográfica de Geografía y Ciencias Sociales; Universidad de Barcelona; Vol. XV, nº 895.
HARVEY, David. A liberdade da cidade. In: Cidades rebeldes: Passe Livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil / Ermínia Maricato… [e tal.]. – 1.ed. – São Paulo: Boitempo: Carta Maior, 2013.
HONORATO, Cláudio de Paula. Valongo: o mercado de escravos do Rio de Janeiro, 1758 a 1831. 2008. Dissertação (Mestrado em História) – Departamento de História, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2008. Disponível em: https://www.historia.uff.br/stricto/teses/Dissert-2008_HONORATO_Claudio_de_Paula-S.pdf Acesso em: 10 jan. 2022
IPHAN. Sítio arqueológico Cais do Valongo: proposta de inscrição na lista do Patrimônio Mundial. Rio de Janeiro, 2016. Disponível em: http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Dossie_Cais_do_Valongo_versao_Portugues.pdf Acesso em: 03 fev. 2022.
LIMA, Evelyn Furquim Werneck; MESENTIER, Leonardo Marques de. O patrimônio industrial na área portuária do Rio de Janeiro: uma proposta de conservação e reuso. In: IV ENCONTRO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO, 2021, Brasília. Anais […]. Brasília: FAU-UnB, 2021. v. 4. p. 654-672.
SEGRE, Roberto e Ortiz, D. Praça Mauá: um portal dinâmico da Cidade Maravilhosa In: Os espaços públicos nas políticas urbanas: leituras sobre o Rio de Janeiro e Berlim / organização Lilian Vaz. – Rio de Janeiro: 7Letras, 2010.
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VASCONCELLOS, L.M. e SILVA, D.S.C.P. A caixa que faz cidade, a conteinerização de áreas portuárias. In: XIII ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PLANEJAMENTO URBANO, 2009, Florianópolis. Anais […]. Florianópolis: UFSC, 2009.
WERNECK, Mariana da Gama e Silva. Os infames termos aditivos e o mico do Porto Maravilha. In: Artigos Semanais. Rio de Janeiro: Observatório das Metrópoles, 30 mar. 2017. Disponível em< https://www.observatoriodasmetropoles.net.br/falacia-do-porto-maravilha-ppps-cepacs-e-o-onus-para-o-poder-publico/> Acesso em: 12 jan. 2022
[1] A escolha do Rio de Janeiro como sede dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de 2016 foi anunciada pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) em Copenhague, no dia 02/10/2009.
[2] De acordo com dados do Portal Rio Transparente (http://riotransparente.rio.rj.gov.br/) para o ano de 2010, o PIB carioca foi da ordem de 150 bilhões de reais, enquanto o total da arrecadação municipal atingiu a marca de 15 bilhões de reais.
[3] Desativado, o cemitério foi encoberto pela malha urbana. Somente em 1996, o Cemitério dos Pretos Novos foi redescoberto, revelando sua localização. No local está instalado o Instituto dos Pretos Novos (IPN). Disponível em: <http://www.pretosnovos.com.br>. Acesso em: 3 jan. 2022.
[4] A estimativa de custo da demolição da Perimetral foi tirada do Relatório do Tribunal de Contas da União (TCU: 007672/2012-8) acerca da demolição do Elevado da Perimetral. Disponível em: <https://tcu.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/315879484/767220128/inteiro-teor-315879604?ref=topic_feed> Acesso em: 12 jan. 2022
[5] De acordo com a equipe da UFRJ, o custo estimado para a implantação do monotrilho equivaleria ao custo da demolição do elevado. O estudo preliminar previa a construção de estações de passageiros ao longo do percurso, além da criação de parques lineares suspensos em pontos específicos. Disponível em <http://novaperimetralrio.blogspot.com/> Acesso em: 2 jan. 2022
[6] Disponível em: < http://www.portomaravilha.com.br/conteudo/imprensa/COLETIVA_FINAL.pdf Acesso em: 12 jan. 2022
[7] Disponível em: https://oglobo.globo.com/economia/predio-na-zona-portuaria-do-rio-vendido-apos-tres-anos-vazio-22368638> Acesso em: 12 jan. 2022
[8] Disponível em: < https://oglobo.globo.com/cultura/teatro/ha-35-anos-na-zona-portuaria-armazem-cultural-das-artes-tenta-reverter-pedido-de-desocupacao-16772957>. Acesso em: 03 fev. 2022.
[9] Disponível em :< https://oglobo.globo.com/rio/zona-portuaria-uma-regiao-de-contrastes-24210821> Acesso em: 12 jan. 2022
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NOTA: artigo originalmente publicado conforme referência a seguir:
DUARTE, C. F. . Paisagem cancelada e assedio urbanistico: o caso do Porto Maravilha no Rio de Janeiro. In: Marta Enokibara, Sandra Medina Benini, Geise Brizotti Pasquotto. (Org.). Paisagem: Pesquisa histórica e aplicada no Brasil e América Latina. 01ed.Bauru: ANAP, 2022, v. 01, p. 43-58.